10/11/2009

Surfista nomada - # 3

Ao inicio achei que era um bocado o Dom Quixote a lutar contra moinhos de vento , pois as vezes o grau de teatro era meticulosamente contado com todos os pormenores, como se tivesse muito ensaio , mas acreditem que não , era o Jonh como se de um encantador de serpentes fosse , a sua flauta eram as suas historias que acima de tudo eram historias de vida com gente dentro.
Sempre tive curiosidade em perceber o que um homem daqueles nunca tinha tido o desejo de constituir família , de ter filhos , mulher para o acompanhar aquelas coisas que todos achamos normal , mas que no fundo para ele nada tinham de significado , ele nesse dia soltou uma gargalhada e disse :
-Olha a tua volta Shrimp! Esta é a minha família , vocês são a minha família , os meus filhos , os meus amigos , sou feliz assim , quando não o for , procuro isso que estas a falar , até lá a minha família é isto…sou o homem mais feliz do mundo , faço o que quero , quando quero…entendem isso?
Em uníssono dizíamos que sim , e o quanto percebíamos o que estava a dizer , pois varias vezes disse que não se via a trabalhar num local fechado , com horários a cumprir , cheio de regras feitas por gente que apenas foram colocados para chatear os outros.
Tinha a sua razão!!!
Sorri com ele , e achei que ele está certo , se era feliz assim porque mudar , era o que o fazia feliz , andar pelo mundo conhecer outros povos , outras culturas , ele viveu em locais que nenhum de nós alguma vez o vai fazer , ele têm fotos de locais tão vastos como a amazónia , viveu com uma tribo de índios nas margens do rio durante um mês .
Sentei-me um dia junto dele , estava longe , muito longe , e disse-me , em Novembro vou partir , tenho a minha mãe doente , o meu pai precisa de mim , aproveito e dou por terminada a minha viagem depois de visitar 26 países.
Senti naquele momento uma enorme vontade de dizer alguma coisa , mas não consegui , achei que o melhor era estar calado e ouvir apenas , pois nestas horas o silencio é de ouro.
Foi falando , que tinha de regressar , afinal pensou que poderia ainda gozar os restantes anos com a família , com os pais que tanto amava , e que afinal talvez fosse apenas assistir ao fim de alguma coisa , é difícil de transmitir alguma coisa quando assim é , mas senti que o desabafo tinha alguma coisa de culpa , tentei , mas de nada valeu eu explicar que é a lei da vida , ele fez o que queria , não se podia culpar pela mãe estar doente. Pelo menos tentei levantar o moral do homem que ninguém conhecia um dia mau , ou mesmo uma palavra ou indicio de tristeza ou amargura , e o que eu via era um Jonh triste , e amargurado e sentindo-se profundamente culpado.
Continuamos a falar regularmente , depois de muita gente a chatear , até os alunos , lá abriu uma conta de MSN , e volta e meia lá trocávamos umas frases , agora que tinha acabado a praia , ele tinha mais tempo disponível , lá ia informando a malta de como estava o mar pelo Oeste , mas o Surf-Report , vai acabar.
Em Outubro fui brindado pela sua visita a Costa , veio sem tábua apenas queria desfrutar umas boas conversas , assim foi , como bom cicerone que sou fui mostrar Lisboa , achei piada que ele me disse , aqui só conheço o aeroporto , daqui vou directo para o litoral , mas Lisboa é bastante bonita , juntamos uns amigos , lá fomos a uma jantarada , ao que ele convida a malta toda para uma jantarada em Peniche pela altura do campeonato , final de Outubro.
Lá ficou marcado , e lá fomos ao jantar de despedida do nosso amigo Jonh , fizemos uma surpresa e todos juntos oferecemos uma 10’ clássica Luffi , onde antes todos assinamos com dedicatória , foi bastante emocionante pois afinal todos nós o conhecíamos a tão pouco tempo , e parecia que éramos amigos a séculos, ficou sem palavras , ao que pedimos essa nunca vendas , ao que a resposta foi :
-Esta vai para o museu , depois de um dia de surf , tenho de a batizar!!!
Bem nem sei mais o que escrever , foram apenas algumas das coisas que se passaram ao longo de 5 meses , em que de perto convivemos com este nómada surfista , que tanta coisa nos ensinou a todos os que de perto conviveram , servem estas linhas para vos transmitir ou pelo menos tentar que todos somos livres e podemos ser felizes com a nossa atitude fazendo alguma coisa de bem , nem que seja uma palavra amiga , ele foi o gajo mais feliz que conheci até hoje , fazia o que queria era um homem livre.
Fica para recordação as longas horas de conversas , e enormes gargalhadas com este homem do pais da terra vermelha que dizem que deriva do sangue derramado , foi mais uma entre muitas coisas que nos transmitiu , entretanto aqui fica os locais do Jonh na sua terra natal Broome Norte da Austrália , onde Cable Beach , foi a sua primeira praia onde apanhou a primeira onda.
Quinta - 17°51'41.37"S - 122°24'29.15"E
Fazenda e casa de família - 122°24'29.15"E - 122°22'5.25"E

Jonh , até um dia destes!!!

1 comentário:

Fora de Estrada disse...

Por vezes acontece-nos isto! Cruzarmo-nos com uma pessoa que nos mostra a simplicidade de ser feliz!... umas ficam perto! outras partem!... mas nunca se esquecem!

Aquele abraço... o clássico!
70s