06/12/2009

Ana Maria .

Ha dois anos partilhei convosco está historia que me de meu dores de cabeça e me tirou o sono durante alguns dias , ontem soube que felizmente a Ana Maria está num lar aqui em Vale de Milhaços , obrigado.
-Posso sentar-me?
Perguntava com a voz trémula de uma velhota.
-Claro que sim!
Respondi eu.
-Está frio hoje, mas nada como o meu tempo, nesta altura do ano já nevava na minha terra.
E eu como sempre sem dar grande importância aquela conversa.
-Sentava-me a lareira com o meu pai e os meus irmãos a comer castanhas e a ouvir as longas historias que só o meu pai contava.
Comecei de facto a ouvir aquela simpática velhota que estava ali sentada a falar comigo.
-Era no tempo em que eu era feliz , nunca tive brinquedos , mas era mesmo feliz!
-Sou de Fazenda , Trás-os-Montes , conhece??
-Não conheço! Respondi
-E muito bonito.
Dito com orgulho, por ela.
Era de facto uma velhota muito simpática que embora e ao que parecia a vida tinha sido madrasta, continuava com a sua memoria viva e de saúde , recordando os factos da sua infância.
Sou sincero as vezes não tenho muita paciência para este tipo de conversa , mas algo me chamou e me deu um puxão de orelhas , e eu pensei , se calhar não têm ninguém para falar.
-Estou sozinha já nem me lembro bem a quanto tempo. O meu marido faleceu a já algum tempo , depois de se cansar de me bater e de beber , os meus dois filhos foram para longe , e nunca mais soube nada deles.
Fiquei gelado , pois estas coisas deixam-me triste e sem saber bem o que dizer, mas lá continuou.
-Trabalhei a vida toda , fui mãe , fui pai , e de repente depois de uma vida de trabalho , aqui estou sem nada , restam as minhas memorias , e nem essas a minha idade as vezes deixa eu lembrar a minha dura vida.
-Que idade têm , eu sei ….perguntei.
-Meu filho isso não é para mim , tenho 76 anos , e desde os 10 que trabalhava.
Olhando o céu e descansando como se procura-se algo para me contar.
-Estava aqui a procura de alguma coisa gira para lhe contar, pois a vida dos jovens é tão complicada que eu não tenho o direito de estar a contar …
Interrompo eu.
-Conte não têm problema , eu gosto de ouvir as pessoas.
-Sabe eu ando sempre por aqui ,e vejo as pessoas diariamente a correrem , passo aqui os meus dias , já nem sei que dia é hoje. Sei que já está frio.
-E dia 1 de Novembro. Estamos quase no Natal. Sorri eu ..
-Natal!
E ficou um silencio de algum tempo como que a recordar algo dos seus natais.
-Sabe eu sei o dia de Natal , a rua fica deserta , vejo luzes nas casas , e vê-se muita gente em casa.
-Pois é verdade.
-Lembro-me o meu Natal em minha casa quando era pequena , éramos muito pobres , e o meu pai pastava nos campos , mas fazias brinquedos com pedaços de madeira que ia encontrando , o jantar era um arroz com um pedacinho de carne e umas feijocas da nossa horta , depois do jantar dava-nos os brinquedos feitos por ele , com a minha mãe atenta e com os olhos molhados das lágrimas da vida dura que tínhamos. Mas eu era feliz.
-Mas o Natal é quando quisermos - Disse eu.
-Eu sei…respondeu
Mais um silencio de cortar.
-Passo dias que nem como , as pessoas todas dizem que não têm , não podem…
-Isto anda mal para todos.
-Acredito! -Respondeu
Meto a mão no meu bolso olho a minha carteira e tinha uma nota de cinco euros e umas moedas , também não tenho grande coisa , mas seguramente mais que esta simpática velhota , e se eu podia ajudar.
-Como se chama perguntei?
-Ana Maria.
-D.Ana , têm aqui cinco euros e mais estas moedas , têm ali uma churrasqueira , e uma pastelaria vá comer uma sopa ou o que lhe apetecer.
-Obrigado meu filho , muito obrigado. Passe aqui um dia para conversarmos mais , tenho coisas giras para lhe contar.
-Não prometo , disse eu , mas vou tentar. Vêm ai o meu transporte.
-Obrigado!!!Muito obrigado!!
E eu apanhei o transporte, mas fui o caminho todo a pensar no que me tinha dito.

No dia seguinte, vou a churrasqueira junto de minha casa , e lá estava ela sentada a comer , não interrompi , mas eu disse a pessoa da churrasqueira que hoje tinha uma cliente V.I.P.
Ela sorrio, e contou-me, chegou aqui e perguntou o preço de algumas coisas e disse que era o dia de Natal dela , e que queria uma sopa bem quente , pois ainda existiam no mundo pessoas amigas.
Eu sorri e senti-me feliz.

Muitas vezes somos nós os culpados desta solidão , a velhice não me preocupa , o que me preocupa e chegar a velho e ser como a Ana Maria. Sozinho.
Beijinho para ela.
Bem hajam.